Procura-se crentes ECLESIOPNEUSTOS.
Não me tenha por saudosista, muito menos por retrógrado. Conquanto não seja “modernoso” a ponto de usar tatuagem ou calça rasgada, não considero minha linha de pensamento como retrógrada. Ao contrário, busco dialogar com as linhas de debate do nosso tempo, com aquilo que compõe a agenda atual do mundo. Neste quesito em especial me diferencio de muitos dos meus colegas que oscilam entre a “pavonice” ministerial e a postura de avestruz, enterrando a mente no solo da ignorância, a cada descoberta sócio científica.
Isto posto, me sinto mais do que autorizado para falar sobre uma necessidade crescente da Igreja chamada cristã: precisamos de crentes, de membros, eclesiopneustos (eclesia = igreja; pneustos = respiração – gente que respira igreja), de gente que respira a igreja, que valoriza o Corpo de Cristo. Gente que, à semelhança de José de Arimateia (Lc.23:50-52), está disposto a correr riscos por amor a Jesus, revelado especialmente no cuidado com Seu corpo.
Sei que as razões para um não envolvimento são as mais variadas, partindo de traumas e decepções passando pela visão da igreja pela ótica do consumidor religioso, alcançando a ausência de maiores exemplos em termos de participação, de envolvimento com a comunidade de fé. Sim, muitos de nós ou não tivemos o privilégio de sermos educados no cuidado e amor à Igreja de Jesus, ou fomos deseducados pelos maus exemplos e referências que se apresentaram diante de nós.
Por esta razão é que a maior necessidade hoje é de gente eclesiopneustos. A ideia do termo vem da paulina palavra a Timóteo ao se referir sobre a inspiração das Escrituras. Para Paulo elas são fruto, resultado da respiração divina (theopneustos – theo = Deus; pneustos = respiração), apontando para a subjetivação e profundidade da ação divina nesse processo de fazimento, de composição, de edição daquilo que hoje conhecemos como Bíblia Sagrada. Neste sentido, crente eclesiopneustos é aquele/aquela que prioriza a vivência em comunidade. Não estamos falando de uma redução da vida à prática religiosa, tampouco atribuindo ao ativismo religioso algum papel preponderante. Estamos, isso sim, afirmando que a igreja precisa de gente que a valorize a tal ponto que esteja disposto(a) a servi-la, e não somente ser servido; que não troque seus cultos, suas celebrações, por quaisquer outras atividades ou agendas; que tenha compromisso e visão do seu sustento, a ponto de não destinar sua participação mensal no sustento da Casa de Oração e na expansão do Reino de Deus, para outras finalidades, por mais santas e justas que sejam, entre outros.
Dentre as muitas crises que as igrejas evangélicas no Brasil vivem, uma das mais graves é a da crescente falta de pertença. É só perguntar a qualquer pastor e ele dirá a quantidade de congregados, de pessoas que frequentam a igreja local, sem que se tornem oficialmente membros. Chega a ser um contrassenso que, em nome da individual e subjetiva experiência de fé, muitos queiram e vejam o culto público e comunitário como um momento de individuação do sagrado, e não de sua coletivização. Não por outro motivo que as igrejas, embora cheias, seguem patinando sem sair do lugar, sem inserção social, sem relevância, devido à falta de recursos (especialmente humanos) para ir além.
Mais do que nunca a Igreja de Jesus precisa de crentes eclesiopneustos. Gente que vibra e ama a Igreja de Jesus. Crente que não confunde autonomia com falta de zelo. Pessoas que tenham compromisso com a Igreja de Jesus, a ponto de não se perderem na agenda, seja pessoal, seja missional. Cristãos que amem estar juntos como família de Deus, ou mesmo que não percam a Celebração e a Comunhão, por outras e menores razões. Pergunte a qualquer pastor e ele dirá quão duro é ver as reuniões da Igreja de Jesus sendo tratadas como o menos importante compromisso da concorrida agenda semanal das pessoas. Aquele tipo de evento que só é atendido na ausência de qualquer outro…
São crentes ECLESIOPNEUSTOS que fazem a diferença na hora da tragédia, como está que agora ocorre no Rio Grande do Sul. Para além da compaixão, sentimento que habitava nosso Mestre antes de cada ação Sua, há a expertise de quem foi treinado na igreja. Veja esse relato de um professor luterano das Faculdades EST de São Leopoldo, RS:
“Hoje de manhã com uma equipe de estudantes demos suporte para servir o café. Foi preciso organizar. Estão no sindicato de metalúrgico, também transformado em posto médico (todas as leis são burladas para cuidar da vida). O sindicato é perto de casa; trezentas pessoas, quase todas de um dos bairro mais pobres onde atuei muito como Secretário de Educação em 2017. Que povo resiliente? Quem vai consolar sai consolado. Vou fazer uma breve etnografia da experiência. O senso de organização que aprendemos em nossas igrejas é fundamental. Fiquei controlando fila para o café. As mulheres que serviam disseram que hoje estava tudo organizado.”
Sim, queridas e queridos, Jesus e Sua Igreja precisam de pessoas eclesiopneustos. Mas não só: o mundo precisa dessa gente amorosa e bem treinada que é chamada de crente. Que tal assumir, ou quem sabe renovar, seu compromisso com a Igreja de Jesus ainda hoje?
Paz e compromisso com o bem, é o que desejo pra você.
Pr. Sergio Dusilek