Novos Caminhos, Velhos Trilhos

abril 27, 2021

O Perturbador de Israel

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 6:48 pm

E sucedeu que, vendo Acabe a Elias, disse-lhe: És tu o perturbador de Israel? Então disse ele: Eu não tenho perturbado a Israel, mas tu e a casa de teu pai, porque deixastes os mandamentos do Senhor, e seguistes a Baalim. (I Reis: 18:17-18)

Perturbador: que causa perturbação; subversivo. Prefixo per: indicando acabamento, ou ação isolada; + turba: multidão, tumulto, turbilhão.

O diálogo se deu durante o período do reinado de Acabe (873-853 a.C.), pouco antes do embate com os profetas de Baal no Monte Carmelo. Israel tinha perdido completamente o referencial bíblico. Já no final do capítulo dezesseis de I Reis, Hilel, completamente distanciado da Palavra, reconstrói Jericó, o que lhe custa dois dos seus filhos. Acabe, o rei, toma por esposa uma mulher espiritualmente maligna (não confunda uma tradição religiosa diferente com malignidade; há membros (Caim, I Jo.3:12), malignos, nas igrejas) que perverte o coração do povo. Assassinatos, grilagem de terras, orgias (essa foi para os puritanos), aconteceram nesse período não só com o povo, mas com os líderes do povo.

A coisa estava tão difícil, que Deus precisa chamar alguém de fora, de Tisbe (?!). Sim, os religiosos, os profetas, toparam aquele sincretismo e pelo conforto palaciano, estavam vendidos a um governo que embora mantivesse cultos a Deus, nada tinha a ver com Ele. Toleraram o conluio e assassinato de Nabote. Toleraram a profusão dos postes sagrados em Israel. O compromisso desses líderes religiosos não era com Deus; era consigo mesmos.

Elias, diferentemente dos tais e claramente direcionado por Deus, ora e por três anos e meio (Tiago 5:17) passa a imperar uma seca em Israel. Ora, se o povo atribuía a fertilidade, a abundância de chuvas para o plantio e farta colheita a Baal, era necessário que Deus mostrasse de modo inequívoco que a benção cai do céu, não brotando do inferno.

Possivelmente foi a partir desse episódio inaugurador do ministério profético de Elias (I Reis 17), que envolve uma oração com largo efeito no espaço público, que a liderança de Israel começou a chama-lo pejorativamente de perturbador. Sim meus queridos e queridas, não é de hoje que se usa a alcunha de subversivo (outra aplicação para perturbador) para tentar isolar e enquadrar o divergente…

Entretanto, o que salta aos olhos no texto é que o subversivo, aquele que nas rodas e redes sociais é visto como desprovido de espiritualidade, é quem ora, e “pior”, é quem Deus atende. Não pense você que não tinha centenas que oravam religiosamente por Acabe e Jezabel e pela nação de Israel. Não pense você que estes que oravam não impressionavam: tinhas roupas sacerdotais, e falavam como pomposos líderes religiosos. Ocorre que, conquanto impressionassem as pessoas, o povo de Deus, não produziam o mesmo efeito no Senhor, que os conhecia.

Mas quem perturbou a Israel? Foi Elias ou Acabe? Qual sentença está correta? A do verso 17 ou a do 18? Me parece que as duas. Explico.

O início da perturbação está em Acabe, como vimos. No entanto, ao instaurar um nova e alienígena espiritualidade no povo, pervertendo-o, Acabe estabeleceu um novo padrão. Ora, se uma tradição se estabelece, sua mudança só pode vir por um processo que envolve uma subversão. Nesse sentido, Elias se torna santa e providencialmente, a resposta subversiva de Deus àquele período de desmandos e de esquisitice religiosa.

Ampliemos um pouco mais essa concepção: o que é a noção de Reino de Deus, senão a subversão (jamais a confirmação) de tudo que aí está? A subversão de todas as convenções que assimilamos, que em nós foram introjetados ao longo dos anos, conferindo ares de normalidade ao que nunca foi normal? Não foi à toa que a poesia foi o estilo escolhido para expressar tão linda subversão, pelo profeta da Graça no Velho Testamento:

E morará o lobo com o cordeiro, e o leopardo com o cabrito se deitará, e o bezerro, e o filho de leão e o animal cevado andarão juntos, e um menino pequeno os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, seus filhos se deitarão juntos, e o leão comerá palha como o boi. E brincará a criança de peito sobre a toca da áspide, e a desmamada colocará a sua mão na cova do basilisco. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar. (Isaías 11:6-9)

Note bem os pares tão opostos, tão paradoxais, subvertendo tudo que sempre aceitamos, pensamos… assim é o Reino de Deus. Um Reino que não se deixa aprisionar às convenções sociais, aos costumes da moralidade, nem às conceituações teológicas. Um Reino que suplanta em muito as amarras doutrinais, nem tampouco se curva a qualquer magistério presunçoso. Sim, porque diante do Rei e da mensagem do Reino, o magistério só pode ser exercido com humildade e poesia… mais provisoriedade, mais dúvidas e menos certezas… perturbador, não?

Embora o exercício do poder cause profunda perturbação, nós que somos do Rei, e por isso proclamadores do Reino, deveríamos ser profundamente perturbadores. Perturbador, não perturbado…

Termino dizendo que os perturbadores padecem de solidão. Sozinhos, balançam estruturas inteiras, motivo pelo qual são constante e covardemente atacados. Estigmatizados por aqueles que deveriam ser seus pares, vêm sua companhia se restringir aos corvos e aos anjos, e quando muito, a um amigo (Eliseu) que se achega. Seus ouvidos estão conectados nos sons que vêm do céu (I Reis 18:41). Suas orações, em compensação, são ouvidas e respondidas. Não raro trazem o céu para a terra. Suas palavras, porque Palavras de Deus, se cumprem, mesmo que seja algum tempo após sua morte. São tão cheios do Espírito, que o Vento, o pneuma do Senhor vem como TURBilhão tomando os perTURBadores para Si. Suas vidas, testemunho, são preservados pelo Senhor da História, O qual não deixa que suas ações sejam apagadas da memória coletiva, da memória social.

Sim, temos ambos os perturbadores entre nós: tanto o padrão Acabe, quando o Elias. Se posso dar um conselho a você? Mire naqueles que estão a léguas de distância dos palácios. Deus está com eles; é neles que a Presença do Espírito é forte. Por isso é que eles perturbam. E muito.

Pr. Sergio Dusilek

sdusilek@gmail.com

abril 23, 2021

A “MORTE” DA CARTA DE GOIÂNIA DA CBB

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 3:09 pm

Pessoas, estive aguardando o desfecho da Carta de Goiânia, motivo pelo qual pouco falei dela.


Na última reunião do Conselho da CBB ela foi “sabiamente” arquivada. Sim, passados mais de um ano de sua leitura, conquanto temas ainda permaneçam latentes na conjuntura social, surgiu um outro mais premente, a Pandemia, que oblubinou a força da Carta. Não por outro motivo estampo abaixo o teor da carta, bem como a decisão publicada no OJB (edição de 25/04/2021).


Como disse um internauta certa vez, quando uma carta que é para ter um teor bíblico, adquire feições ideológicas tem-se um problema. Em contrapartida, quando um documento com alto teor bíblico é acusado de ideológico, quem o faz dá um tiro no pé. Isso porque ou prova que os assuntos não estão na Bíblia (tarefa inglória, pois o próprio relator da comissão que deu o parecer pelo arquivamento além de elogiar o texto, pontuou que a carta tinha impressionantes 32 citações bíblicas), ou termina se afirmando que a própria Bíblia é de esquerda.


Disse no Conselho da CBB: a remessa, sob a alegação de conteúdo esquerdizante da Carta para o Conselho, foi o fator que deu ampla visibilidade ao documento. Não fosse isso, teria o mesmo e desconhecido fim das Cartas de Natal, Poços de Caldas, etc.


Alguns conselheiros obstaram o desconforto com termos da Carta. Lembrei a eles que, conquanto a redação estivesse aberta à contribuições, sugestões, desde o primeiro dia da Assembleia, somente no penúltimo dia recepcionamos três contribuições (das quais nenhuma era dos conselheiros). Também assinalei para os tais que não houve qualquer desconforto deles quando da saudação em vídeo do atual Presidente à Assembleia da CBB em Natal, bem como do púlpito ocupado pelo “adjunto” da Ministra Damares, o qual reinseriu o sobrenome do Presidente na Assembleia ao saudá-la de um modo estranho à prática da prédica batista. Os que suportamos essa profanação, sentimos calados, silentes nos assentos.


Termino essa postagem lembrando que ao tentarem abafar uma carta com teor bíblico em nome de suas preferências, ideologias políticas, os mensageiros da CBB em Goiânia produziram e um fato, um testemunho histórico, que normalmente não é revelado nos documentos oficiais da denominação: há uma firme, operosa e grande resistência ao que está aí, a esse conluio de estruturas religiosas com o poder. Criou-se o testemunho de uma resistência, QUE Agora precisa ser reunida.

Não se matam textos. Eles são autônomos. Não se abafa ideais: eles pulsam por debaixo das lonas. Não se mata ideias: elas estão aí, circulando na atmosfera, sendo captadas por diferentes e humanas parabólicas.

[Segue o texto da Carta de Goiânia – Apresentado na Assembleia da CBB em Goiânia, em Janeiro de 2020]


A Convenção Batista Brasileira, reunida em sua 100a. Assembleia na cidade de Goiânia/GO, dirige-se a sociedade brasileira num clamor pela paz, diante dos seguintes desafios:


1) JUSTIÇA:

Reconhece com preocupação que o fosso da desigualdade social tem sido ampliado em todo mundo, inclusive no Brasil, fazendo que poucos tenham muito e muitos tenham pouco; (Jr 22.13);

Lamenta que por conta dessa desigualdade nossos semelhantes sejam expostos às situações de vulnerabilidade, impingindo dor, tristeza e desesperança especialmente às crianças e idosos. Lamentamos também a situação de miséria e injustiça a que são submetidos os refugiados em todo o mundo (Dt. 10.17-18; Dt. 24.17).

Reprova por conta disso toda tentativa de desmonte do aparato social que ainda protege os que não tem vez e voz, (Pv. 19.17, Pv. 14.31), bem como rejeita o impingir ao pobre a responsabilidade pelos mais diferentes desafios brasileiros;

Conclama os batistas brasileiros a buscarmos a paz social, através da diminuição da desigualdade social (Lc 14.12,13; Sl 85.10).

Encoraja a todos os brasileiros a amarem a Justiça, (Is. 61. 8 ), exercerem o compartilhamento e a misericórdia, (1Jo 3.17,18), a investirem seus recursos em iniciativas que apoiem pessoas que nada tem. Estimula ainda todo o combate à corrupção e a sonegação, que são endêmicas nesse país (Mt. 22:21; Rm 13.5-7).


2) VIOLÊNCIA:

Reconhece, com pesar e preocupação, o aumento das notificações de violência contra mulheres (feminicídios) e contra as crianças (Tg. 1.27;).Reconhece em contrapartida a diminuição dos casos de homicídio.

Lamenta que ainda hoje mulheres e crianças tenham sua integridade emocional e física aviltadas (Jr. 22.3). Não é por outro motivo que lembramos, consternados, que o Brasil entrou na rota dos atentados em escolas, como aconteceu no Rio de Janeiro, Goiânia e Suzano (SP). Lamentamos que diante de tantas tragédias, queiram facilitar a posse e o porte de armas nesse país (Pv. 20.22; Sl 37.11).

Reprova toda e qualquer forma de vilipêndio à dignidade humana, especialmente no tocante às mulheres e as crianças, bem como a toda polarização e hostilidade que venham a ser alimentadas no seio familiar.

Conclama a sociedade brasileira a preservar a vida e dignidade de nossas crianças como investimento, legado no futuro de paz;

Encoraja que sejam amplamente divulgados todos os programas do Governo e do Terceiro Setor que promovam a vida, a paz e a segurança para as mulheres e crianças.


3) FAMÍLIA:

Reconhece o estrago feito pela polarização política no seio de muitos lares, igrejas, gerando rancor em lugar de congraçamento (Hb 12.14);

Lamenta que tal hostilização impeça o caminhar fraterno e amigo, a vivência da paz nas relações pessoais;

Reprova o uso de informações falsas, mentiras, que buscam disseminar ainda mais a discórdia e a dissensão (Ex. 23.1; Tg. 4.11);

Conclama a sociedade brasileira para que volte a enxergar o lar como um lugar de diálogo, de harmonia, de benquerença mútua e de respeito, como lugar de refúgio e paz;

Encoraja a todos para que nos esforcemos na manutenção da família, tal qual preconizada nas Escrituras Sagradas, (Gn. 2.24; Mc. 10.6-9), na promoção da unidade e da paz sobre todas as relações. (I Pd 3.11).


4) TOLERÂNCIA:

Reconhece com indisfarçável e desconfortável surpresa, o aumento da intolerância.

Lamenta que esse clima de intolerância tenha invadido o campo religioso, contaminado as relações étnicas, polarizado o universo político e tornado impossível, para muitos, a convivência numa mesma comunidade de fé (I Pd. 2.17; Cl. 3.13; At.10.34);

Reprova toda e qualquer ameaça às relações interpessoais e fraternais pelo desrespeito com o diferente, com a alteridade, com o pensamento discrepante, bem como toda e qualquer ilação com os valores ou com o discurso presente nas ideologias extremistas.

Conclama a todos e todas a valorizar os princípios batistas, pilares constitutivos da modernidade, dentre eles a liberdade nas suas três formas: de consciência, de expressão e de culto (religião) (Jo. 8. 31-32; II Co. 3.17; Gl. 5.13),

Encoraja todos e especialmente os batistas brasileiros que prezem pela liberdade, que celebrem a alteridade e que construam na diversidade e até mesmo na dialética, a unidade, a paz, promovendo um clima de tolerância ao diferente.


5) VIDA:

Reconhece o clima perigoso e beligerante no qual o mundo adentrou, com o acirramento das tensões, provocações e incitamento à guerra;

Lamenta que a vida e a paz não esteja ameaçada somente pela guerra iminente, mas sobretudo pelo menosprezo com o meio-ambiente o que pode ser exemplificado com as florestas em chamas, e visualizado na fumaça australiana que deu a volta no globo terrestre.

Reprova toda falta de esforço dos líderes mundiais no cuidado do meio ambiente, bem como toda tentativa de culpabilizar o mais pobre pelos males ambientais;

Conclama os governos deste mundo a promoverem e apoiarem programas marcados pelo compromisso com a sustentabilidade e pela defesa da paz;

Encoraja a sociedade a promover a paz (Mt. 5.9; Rm. 14.9; Sl 122.6-7) e a valorizar a vida, na compreensão de que a preservação desse mundo criado, como ato de mordomia a Deus, é o que cabe a cada um de nós para a nossa existência (Rm 8.19-23).


Goiânia, 26 de janeiro de 2020
A comissão: Relator – Guilherme de Amorim Avilla Gimenez (SP); Klaus Peter Friese (SC); Nilson Gomes Godoy (FL); Rosane Andrade Torquato (PR); Sergio Gonçalves Dusilek (CA)

abril 17, 2021

Não desprezem os pequenos começos. (Zc.4:10a)

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 10:23 pm

Abril do ano passado: 1 ano atrás. Recebo um recado de um pastor que trabalha na revitalização de uma igreja que está numa comunidade aqui do Rio, onde inclusive já preguei. Seu clamor: as famílias estão com fome. Com restrição de locomoção, recessão e sem funcionamento da escola com suas refeições, não havia comida. Ouvi aquele recado com o coração apertado: quem sou eu e quem é a Igreja Batista Marapendi para ajudar a socorrer uma comunidade?

Coloquei o desafio em oração diante de Deus. Ao acabar de orar, senti Deus mandando prosseguir. Preparei um texto, enviei para alguns contatos. Não me lembro direito, mas arrecadamos mais de 60 cestas básicas. A Igreja, seu salão de culto, virou uma casa de pão: repleta de alimentos.

Uma irmã que frequenta, quando pode, nossa igreja soube desta campanha. Ela, apesar de nova, já possui um nome no seu ramo de atuação profissional de arquitetura e design de interiores. Ela soube, então, de um grupo de arquitetos que, como outros membros da sociedade civil, se mobilizaram para socorrer os desvalidos diante da fome, pois quem a tem, tem muita pressa. Um trabalho maravilhoso de mobilização que mostra que a misericórdia, valor do Reino de Deus, não está restrita à Igreja. Ela se envolveu com o grupo e colocou aquela igreja e comunidade na rota do destino das cestas. Desde Maio do ano passado, 100 cestas são entregues lá…

Mês passado foram distribuídas quase 60 cestas. Foi um acréscimo ao trabalho que o nosso Barnabé da Igreja, o querido Walter, quem nos mobiliza para a quantidade regular de cestas que disponibilizamos para algumas famílias que o projeto social da igreja acompanha.

Recentemente iniciamos uma nova campanha. A meta era atingir 100 cestas básicas. Antes que você considere o alvo insignificante, lembro que nossa igreja não é numerosa, mas extremamente generosa. Ao enviar o novo texto convite-apelo, um amigo, querido irmão que mora em São Luís, pediu para adaptar o texto e fazer uma campanha por lá. Resultado, distribuíram hoje, em duas comunidades, 230 cestas básicas.

Nossa campanha recebeu a solidariedade de gente de fora da igreja, de amigos, de gente de outras expressões religiosas e de gente que não professa religião alguma. Além, é lógico, da generosidade da membresia da Igreja. Como disse, acho que serão mais de 100 cestas… Sem contar a disposição e o envolvimento de irmãos da igreja para fornecerem quentinhas aos moradores de rua.

Contabilizou? 1160 + 60 + 244 (Walter) + 230 + 100* = 1794 cestas, incluindo as que o irmão Walter mobiliza. Se pensar em 13Kg em média que as cestas pesam, são mais de 23 toneladas.

Nós não temos ideia do que uma ação pode gerar, o ciclo virtuoso que ela pode instaurar. Quando um desafio chegar até você, ore. Depois faça o que está ao seu alcance. O resto é com Deus. Lembrando que um agente histórico nunca tem plena consciência do impacto de sua ação.

Compartilho essa experiência com duplo intuito, e com enorme constrangimento pessoal. No entanto, acho importante enfatizar que Deus usa a qualquer um. Por isso, nunca desmereça sua ação e o desafio que se apresenta a você.

Compartilho também para agradecer a todos que se envolveram e ainda se envolvem. Sua compaixão, misericórdia, solidariedade são o rosto de Deus para as pessoas que passam fome hoje. Muito obrigado! Deus abençoe a todos!

Louvado seja Jesus Cristo!

Pr. Sérgio Dusilek

sdusilek@gmail.com

abril 10, 2021

A IGREJA SEMPRE DEU UM JEITO.

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 7:50 pm

A IGREJA SEMPRE DEU UM JEITO.

A Igreja sempre deu um jeito,

Quando da perseguição instalada sobre a Igreja Primitiva ela foi para as casas,

Quando da impiedosa caça dos imperadores romanos, ela foi para as catacumbas,

Quando da Peste Negra, ela abriu seus espaços para acolher e tratar dos doentes

A Igreja sempre deu um jeito,

Quando em momentos de lutas por independência, engrossou fileiras;

Quando em guerras civis, atuou, ainda que em constante deslocamento, no cuidado dos feridos;

Quando das grandes guerras, no deslocamento populacional, na recepção do imigrante, no fornecimento de capelães.

A Igreja sempre deu um jeito,

Na doença, na guerra, na adversidade,

Nunca requerendo para si um status de desigualdade,

Nem pretensos privilégios quando do poder desfrutava de proximidade.

A Igreja sempre deu um jeito,

Pois quem a compõe tem uma Cruz no peito,

Marcando a fluidez da sua representação,

Nem se curvando a qualquer forma de dominação.

A Igreja sempre deu um jeito,

Porque ela nada tem a ver com propriedade, com fachada,

Uma vez que Deus não escolheu habitar onde o culto é feito,

Antes tornou o coração humano sua terra sagrada.

A Igreja que sempre deu um jeito,

Não deveria engrossar as fileiras de radicais fundamentalistas,

Nem concordar com argumentos de governantes vindos de fábrica com defeito,

Antes, seguir discernindo saídas no melhor da tradição iluminista.

A Igreja que sempre deu um jeito,

Hoje se encontra privilegiada,

Podendo fazer uso de uma tecnologia já disponibilizada,

Para manter a vida comunitária, a fé e o bom senso.

A Igreja que sempre deu jeito,

É aquela que sempre se voltou para o Jesus de Nazaré,

Em quem “crente é crente e mané é mané”,

O Cristo da ampla Inculturação, da emergência da legítima fé.

É dessa Igreja que sempre deu jeito,

Que com alegria faço parte,

Que entende o valor da vida como reflexo da sua mensagem,

Contribuindo para baixar, dos mortos, a contagem.

abril 2, 2021

O QUE NOS DISTINGUE COMO GRUPO RELIGIOSO?

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 2:03 pm

O QUE NOS DISTINGUE COMO GRUPO RELIGIOSO?

(Os Batistas e Seus Princípios)

Pr. Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek

Igreja Batista Marapendi-RJ

Imagine caro leitor, que um acadêmico que estuda as Religiões, ao ser instado por força da sua pesquisa a ler a Bíblia, acabe se convertendo. Ele, sabendo que você é um cristão batista, vem até você, compartilha a novidade e lhe faz a seguinte pergunta: para qual Igreja eu devo ir? Logicamente que eu e você já sabemos a resposta: Igreja Batista (e da CBB, porque a dos caracóis, para ficar num exemplo, não dá…).

Esse pesquisador, cônscio do que é o protestantismo, de sua história, crava a segunda pergunta: por que a Igreja Batista? Qual é sua diferença? Logicamente que não estamos falando aqui da virtuosa e transparente prestação de contas, nem tampouco do congraçamento fraternal sadio, igualitário (sem acepção de pessoas) que existe (ou deveria existir) numa igreja batista. Estamos falando daqueles elementos distintivos que por terem essa condição, são também identitários. Tais elementos que marcariam nossa identidade, também seriam os que nos diferenciam das demais denominações.

Você saberia dizer quais são eles?

Possivelmente alguém arriscaria na declaração doutrinária. Ocorre que, como herdeiros da Reforma, os batistas não possuem o que poderíamos chamar de uma originalidade doutrinal. Nossas primeiras confissões estão mais para uma colcha costurada com panos diferentes. Sim, os primeiros batistas não sentiram a necessidade de “reinventar a roda”. Eles selecionaram, daquilo que já existia, as partes que entendiam ser as mais fiéis à sua leitura da Bíblia. Note bem: sempre em relação a Bíblia e esta, internamente, sempre em relação a Jesus Cristo, o Verbo encarnado. Nota-se aqui que a fidelidade, e não a originalidade, é uma marca distintiva batista.

Tal postura seletiva (e que bela seleção!), trouxe consigo três implicações:

  1. A não promoção da Confissão de Fé ao status de Credo. Lembre-se que, historicamente os batistas aparecem no movimento separatista inglês. Para eles, proto-batistas, nada mais estranho que a imposição de um Credo. Eles se insurgiram contra um… o que se constituiria numa outra marca distintiva batista: sua capacidade crítica, termo este aqui entendido como capacidade para avaliar, sopesar a realidade, as informações, e sugerir ou adotar caminhos condizentes, coerentes com tal pensamento;
  2. A não adoção de um Credo reside num ponto basilar para os batistas: a Bíblia como esteio para a vivência da fé cristã. Como lembra Walter Schurden, a adoção de um Credo, ou a promoção de uma Confissão, de uma Declaração Doutrinária (que seja) a esse status resulta numa indesejável (para o batista “raiz”) diminuição do valor da Bíblia. Isso porque o Credo passa a ter força reguladora, o que implicaria numa inadmissível revisão do valor da Bíblia. Explico: ao promover algo a Credo, rebaixamos por outro lado a Bíblia, igualando-a a um Credo (credo!). Implicaria dizer que certa leitura do texto, mesmo que circunscrito ao seu tempo, ao seu contexto, é igual a Palavra de Deus… Todo bom batista, não falo desses “nutelas” que tem por aí, tem dificuldade de aceitar tal formulação. Em outras palavras, ao rejeitar essa noção credal, os batistas assumem o que suas Confissões ou Declarações de Fé partem da Palavra de Deus, mas definitivamente não são a Palavra de Deus.
  3. O não fechamento de alguns pontos doutrinários. A beleza da Declaração Batista, daí sua durabilidade, é justamente aquilo que para alguns parece ser sua maior falha: sua abertura. Penso que essa abertura é decorrente do texto bíblico. Se é verdade que a Bíblia fecha questão em alguns pontos, também é verdade que ela não fecha em outros. Nela você tem passagens mais próximas, por exemplo, do olhar de Calvino, assim como outras que se achegam mais a Armínio. Como isso se traduz em nossa declaração? Numa Graça Irresistível (Calvino) pela qual o crente não perde sua salvação, que é alcançada pela liberdade de escolha, pela resposta ao convite divino. O resultado é a eleição. Paradoxal? Não acho que seja. Prefiro chamar de bíblico.

Há outros pontos de abertura como é o caso da escatologia, ou ainda sobre a antropologia cristã: mal radical apresentado por Kant ou o mal “pedagógico” de Rousseau? Em termos da Teologia dos Reformadores: depravação total de Calvino ou influência do pecado em Lutero e Melanchton?

A doutrina batista se fecha sobre Jesus Cristo, sobre a Cristologia. É a partir dEle, ensino, vida e obra que se deve julgar todo o resto. Cá entre nós, caro leitor, eu considero aquelas aberturas e esse fechamento fantásticos. E você?

Uma outra pessoa poderia sugerir alguns pontos eclesiológicos, que constam de nossas doutrinas. Governo congregacional da Igreja; batismo por imersão (jamais por balde ou bacia (??!!)); celebração da Ceia como Memorial. Ocorre que tais elementos conquanto ganhem maior aderência e profusão no meio batista, não são exclusivos a nós. Zwinglio, assim como outros anabatistas (por exemplo), celebravam a Ceia como Memorial e batizavam por imersão. A título de curiosidade, no Colóquio de Marburgo, convocado por Felipe de Hesse como tentativa de unir as diferentes frentes da Reforma contra os católicos e os embates que eclodiam, os principais reformadores, ao debruçarem sobre um dos grandes símbolos de Unidade da Igreja que é a Ceia, acabaram mantendo o dissenso…

Quanto ao modelo congregacional, embora pareça existir (para nossa surpresa e tristeza) um desencantamento com ele em algumas Igrejas Batistas, ele nunca foi uma exclusividade nossa. Assim também é a visão dos oficiais da igreja numa perspectiva funcional e não clerical, que implica em dizer que embora o pastor seja um membro como os demais, ele está investido de liderança, na condução do rebanho que é de Jesus. Tal compreensão não é exclusiva dos batistas.

Onde estaria, então, nosso elemento identitário?

Para mim, ele está calcado justamente sobre os nossos Princípios. São eles que fornecem as lentes pelas quais lemos a realidade, interpretamos a Bíblia, formulamos as doutrinas. É neles que reside a nossa originalidade, nossa identitade. Se alguns deles não são exclusivos a nós nos dias de hoje, podemos dizer que boa parte desses princípios nasceram conosco.

Um clássico exemplo é nossa ênfase na liberdade, cujo legado Moderno foi a tríplice coroa da liberdade de consciência, liberdade de expressão e liberdade religiosa, é talvez a grande marca que temos. O resultado disso é que os batistas não nos misturamos em fileiras para apedrejar religiosos de outras religiões, mesmo porque já sofremos tentativas de apedrejamento no Brasil, quando aqui chegamos. Ao contrário disto, optamos, como a PIB da Vila da Penha (RJ) na época do Pastor João Mello, em cerrar fileiras para denunciar atos, inclusive violentos, que atentem contra a liberdade religiosa.

Fruto da liberdade, os batistas defendemos o princípio da competência do indivíduo, sobre o qual comentei mais detidamente, mas não exaustivamente, em artigo publicado pelo OJB de 28/12/2021. A liberdade é um bem inalienável do ser humano. Por isso os batistas são contra toda forma de ditadura, não importando se de esquerda ou de direita, bem como repudiam toda forma de imposição, motivo pelo qual nasce o princípio da autonomia das Igrejas e o modelo cooperativo de trabalho denominacional. Uma implicação prática? A denominação sugestiona, nunca recomenda nada às Igrejas; já estas recomendam, através de seus mensageiros à denominação.

Essa liberdade atinge também a relação com o Estado. Os primeiros batistas viram o que as páginas da Bíblia sempre ecoaram: nenhuma ligação com o poder estatal amplia a liberdade; todas elas se traduzem em amarras que impedem nossa livre expressão, o pleno exercício de nossa consciência. Os batistas sempre se propuseram, a partir dos seus Princípios, a respeitarem as autoridades constituídas, mantendo concomitantemente, uma consciência crítica para toda forma de governo, inclusive no tocante a seu governante. Como bem diz o gigante pastor Gunther Carlos Krieger, não sem razão missionário da JMN amado por todo batista deste país: “O Profeta não deve morar dentro do Palácio, mas na porta dele, a fim de que possa denunciar os desmandos do rei.” Talvez precisemos acrescentar: nem frequentar o avião, nem o carrão, nem a mesa deste rei…

Termino dizendo que a abordagem final de alguns princípios se deu em forma de citação, un passant. Nosso objetivo ao mencionarmos rapidamente alguns dos mais caros Princípios Batistas foi simplesmente realçar o argumento que nosso elemento identitário (os Princípios) é também, ao que nos parece, o mais esquecido como grupo sócio-religioso que somos. Essa impressão me faz recordar aqui do sensacional livro Teologia dos Princípios Batistas, escrito pelo notável Pr. Dr. John Landers (outrora missionário de Richmond e professor do Seminário Batista do Sul), que fora editado pela JUERP, editora esta que tanto contribuiu para a causa batista e teológica no país. Se você puder, tente adquiri-lo. Ou melhor ainda: peça ao querido Pr. Sócrates para reimprimi-lo pela Convicção Editora. Afinal, se somos um povo da “Convicção”, nada melhor que sabermos as raízes onde ela repousa.

Blog no WordPress.com.