Novos Caminhos, Velhos Trilhos

maio 7, 2024

Procura-se crentes ECLESIOPNEUSTOS.

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 1:14 pm
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Procura-se crentes ECLESIOPNEUSTOS.

Não me tenha por saudosista, muito menos por retrógrado. Conquanto não seja “modernoso” a ponto de usar tatuagem ou calça rasgada, não considero minha linha de pensamento como retrógrada. Ao contrário, busco dialogar com as linhas de debate do nosso tempo, com aquilo que compõe a agenda atual do mundo. Neste quesito em especial me diferencio de muitos dos meus colegas que oscilam entre a “pavonice” ministerial e a postura de avestruz, enterrando a mente no solo da ignorância, a cada descoberta sócio científica.

Isto posto, me sinto mais do que autorizado para falar sobre uma necessidade crescente da Igreja chamada cristã: precisamos de crentes, de membros, eclesiopneustos (eclesia = igreja; pneustos = respiração – gente que respira igreja), de gente que respira a igreja, que valoriza o Corpo de Cristo. Gente que, à semelhança de José de Arimateia (Lc.23:50-52), está disposto a correr riscos por amor a Jesus, revelado especialmente no cuidado com Seu corpo.

Sei que as razões para um não envolvimento são as mais variadas, partindo de traumas e decepções passando pela visão da igreja pela ótica do consumidor religioso, alcançando a ausência de maiores exemplos em termos de participação, de envolvimento com a comunidade de fé. Sim, muitos de nós ou não tivemos o privilégio de sermos educados no cuidado e amor à Igreja de Jesus, ou fomos deseducados pelos maus exemplos e referências que se apresentaram diante de nós.

Por esta razão é que a maior necessidade hoje é de gente eclesiopneustos. A ideia do termo vem da paulina palavra a Timóteo ao se referir sobre a inspiração das Escrituras. Para Paulo elas são fruto, resultado da respiração divina (theopneustos – theo = Deus; pneustos = respiração), apontando para a subjetivação e profundidade da ação divina nesse processo de fazimento, de composição, de edição daquilo que hoje conhecemos como Bíblia Sagrada. Neste sentido, crente eclesiopneustos é aquele/aquela que prioriza a vivência em comunidade. Não estamos falando de uma redução da vida à prática religiosa, tampouco atribuindo ao ativismo religioso algum papel preponderante. Estamos, isso sim, afirmando que a igreja precisa de gente que a valorize a tal ponto que esteja disposto(a) a servi-la, e não somente ser servido; que não troque seus cultos, suas celebrações, por quaisquer outras atividades ou agendas; que tenha compromisso e visão do seu sustento, a ponto de não destinar sua participação mensal no sustento da Casa de Oração e na expansão do Reino de Deus, para outras finalidades, por mais santas e justas que sejam, entre outros.

Dentre as muitas crises que as igrejas evangélicas no Brasil vivem, uma das mais graves é a da crescente falta de pertença. É só perguntar a qualquer pastor e ele dirá a quantidade de congregados, de pessoas que frequentam a igreja local, sem que se tornem oficialmente membros. Chega a ser um contrassenso que, em nome da individual e subjetiva experiência de fé, muitos queiram e vejam o culto público e comunitário como um momento de individuação do sagrado, e não de sua coletivização. Não por outro motivo que as igrejas, embora cheias, seguem patinando sem sair do lugar, sem inserção social, sem relevância, devido à falta de recursos (especialmente humanos) para ir além.

Mais do que nunca a Igreja de Jesus precisa de crentes eclesiopneustos. Gente que vibra e ama a Igreja de Jesus. Crente que não confunde autonomia com falta de zelo. Pessoas que tenham compromisso com a Igreja de Jesus, a ponto de não se perderem na agenda, seja pessoal, seja missional. Cristãos que amem estar juntos como família de Deus, ou mesmo que não percam a Celebração e a Comunhão, por outras e menores razões. Pergunte a qualquer pastor e ele dirá quão duro é ver as reuniões da Igreja de Jesus sendo tratadas como o menos importante compromisso da concorrida agenda semanal das pessoas. Aquele tipo de evento que só é atendido na ausência de qualquer outro…

São crentes ECLESIOPNEUSTOS que fazem a diferença na hora da tragédia, como está que agora ocorre no Rio Grande do Sul. Para além da compaixão, sentimento que habitava nosso Mestre antes de cada ação Sua, há a expertise de quem foi treinado na igreja. Veja esse relato de um professor luterano das Faculdades EST de São Leopoldo, RS:

“Hoje de manhã com uma equipe de estudantes demos suporte para servir o café. Foi preciso organizar. Estão no sindicato de metalúrgico, também transformado em posto médico (todas as leis são burladas para cuidar da vida). O sindicato é perto de casa; trezentas pessoas, quase todas de um dos bairro mais pobres onde atuei muito como Secretário de Educação em 2017. Que povo resiliente? Quem vai consolar sai consolado. Vou fazer uma breve etnografia da experiência. O senso de organização que aprendemos em nossas igrejas é fundamental. Fiquei controlando fila para o café. As mulheres que serviam disseram que hoje estava tudo organizado.”

Sim, queridas e queridos, Jesus e Sua Igreja precisam de pessoas eclesiopneustos. Mas não só: o mundo precisa dessa gente amorosa e bem treinada que é chamada de crente. Que tal assumir, ou quem sabe renovar, seu compromisso com a Igreja de Jesus ainda hoje?
Paz e compromisso com o bem, é o que desejo pra você.

Pr. Sergio Dusilek

fevereiro 10, 2024

Por que você não sai da CBB, já que você não concorda com ela?

Filed under: Sem categoria — sdusilek @ 12:55 pm
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Por que você não sai da CBB, já que você não concorda com ela?

Esta foi a palavra que recebi nessa semana de um colega pastor. A seu favor, ele não é o único a pensar assim. No meio batista atual cresce, como erva daninha, os batistinhas: dispostos a defenderem a CBB contra os princípios batistas e a considerarem o expurgo dos divergentes como uma genuína alternativa batista.

Logicamente que há alguns problemas sérios com esse tipo de posicionamento e o que ele revela.

O primeiro e mais evidente é o desconhecimento do espírito batista que, por açambarcar a democracia e o governo congregacional, não pode prescindir da tensão inerente a todo processo democrático. Sim, a fundamentada e pertinente divergência deveria ser celebrada (e não combatida), como sinal da vigência da energia vital que deve pulsar em uma denominação de regime congregacional como a Batista. 

Neste sentido, a ausência de contrapontos em relatórios, não deveria ser celebrada, mesmo porque ela pode indicar uma desídia e um desinteresse crescente com a “res batista”. Cabe perguntar a quem interessa este assinalado desinteresse… 

A celebrada paz na apreciação de um relatório não é sinal, necessariamente falando, de aprovação divina. Pode ser resultado também do abuso de recursos regimentais e parlamentares, ou de manipulação, entre outros fatores.

O segundo problema desse tipo de posição é que ele nega o desconhecimento dos princípios batistas, onde reside o nosso DNA. Tal desconhecimento se manifesta, em termos práticos, com certa exigência de submissão cega a uma liderança, como se ela sempre fizesse o que Deus quer. Uma espécie de salvo-conduto prévio. Como se uma diretoria, ou um Conselho, tivesse a capacidade e investidura para dar o “imprimatur” batista. Além de não ser bíblico, tal expectativa suprime e sublima a divergência, além de colocar a pecha de “perturbador de Israel” em quem é crítico. Todavia, biblicamente falando, quem era o perturbador da Casa de Israel? Elias ou Acabe? O divergente ou o líder? O mensageiro ou o que preside, governa? 

O  terceiro problema é mais sério. Envolve uma indisposição para com quem pensa diferente a ponto de tentar descredenciar tal pensador. Trata-se de algo estranho aos batistas justamente por ser um movimento inquisitorial aliado à constituição de um pretenso e pseudo magistério teológico, o qual pretende chancelar aqueles que seriam os batistas verdadeiros. Nada mais falso e tão contrário à nossa tradição do que isso. Na esteira desse movimento, tem gente promovendo a declaração doutrinária a um credo, concepção absurda para os batistas ao longo da história, porém plenamente compatível aos fundamentalistas e àqueles que não se despiram do romanismo, mesmo após terem abandonado tal tradição. Sem contar que, frequentemente os integrantes de tal sinédrio Batista, são mal formados teologicamente falando.

O quarto e último problema que aponto aqui, nesta lista que não se esgota em si mesma, tem a ver com o futuro dos batistas. Ora, é visível o desmonte denominacional, exemplificado na crescente desmobilização patrimonial e no surgimento de pequenas denominações (no modelo assembleiano de igreja matriz e igreja filial) que ocorrem debaixo do nariz da CBB. O que poucas pessoas notam é que tibieza denominacional é diretamente proporcional ao silenciamento dos seus profetas. Quantos inquietantes avisos esta denominação ouviu? Quantos foram desconsiderados? Quantos profetas foram relegados ao deserto denominacional?

Sociologicamente falando, todo grupo incapaz de fazer, promover ou ouvir uma autocrítica, está fadado a desaparecer como instituição. Pierre Bourdieu, Rubem Alves, Roger Bastide, entre outros falam do perigo da acomodação de um grupo religioso em sua fase mais institucional. Para você descrente no que digo, permita-me  contrapor à sua incredulidade um dado comparativo: em Julho de 2003, quando ainda estava na JUMOC, o Despertar reuniu 2000 inscritos em Curitiba. Estamos falando de JOVENS de várias regiões do país. Pois em janeiro de 2024, em plena turística Foz do Iguaçu, a assembleia da CBB reuniu a mesma quantidade de inscritos. Com um detalhe: agora estamos falando de um público massivamente composto por adultos e idosos, evidentemente com maior poder aquisitivo.

A grande questão, portanto, que tais colegas (aqueles do início do texto) parecem procurar ignorar, é que quem pensa diferente do que aí está, pode representar mais o espírito batista, mais o legado genuíno, do que a versão institucionalizada vigente. A História, especialmente a que se volta para as religiões, está repleta de casos de grupos que se perderam ao longo do tempo, deixando de ser o que nasceram para ser. Tornaram-se, ao longo da história, estranhos a tudo aquilo que ensejou seu nascimento. Perderam o “sagrado selvagem”. 

Será assim com os batistas da CBB também? O tempo, que segue implacável, e a História dirão. Entretanto, uma coisa é certa: a probabilidade, diante do rumo dado pelos atuais timoneiros da CBB, é grande. Possivelmente, daqui há algum tempo, os batistas serão uma sigla religiosa vazia de significado; ou pelo menos da razão primeira e fundante a qual os fez surgir historicamente na modernidade.

Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça.

Dr. Sérgio Dusilek 

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